Criação, Conexão, Lives, Pós-pandemia

1º de outubro, dia internacional da música. Data que comemora a arte que se faz presente na vida de todos nós. Isso porque é praticamente impossível quem não tenha uma ou várias músicas favoritas que marcaram momentos/experiências do passado.

As sensações que uma melodia pode provocar são incontáveis. Alegria, animação, saudade e até mesmo tristeza (dependendo da ocasião). Como uma companheira fiel, não é à toa que muitos dizem que a música é capaz de traduzir nossos sentimentos.

A arte que provoca tantas emoções em cada um de nós é fruto da dedicação e produção de compositores, músicos e até mesmo professores, responsáveis por dar forma a letras que inevitavelmente, instigam nossos pensamentos.

Para comemorar essa data, nada mais adequado do que proporcionar um espaço de fala para quem vive da música. O compositor, educador musical e empreendedor cultural Felipe Azevedo, traz uma reflexão sobre sua relação com essa área que transformou sua vida pessoal e profissional, inclusive em tempos de pandemia.

Minha relação com a Música tem sido até hoje de aprendizados, entre o inusitado e a vibração incessante.

Tudo principia pela escuta, na maioria das vezes, interior, e no meu caso, seguida do gesto criativo; um gesto que além de sensível, é também, de invocação de memórias, de histórias de vida.

E esta escuta, de um modo geral, tem se transformado significativamente nos tempos recentes.

Destaco 04 cenários, neste sentido, em processo de transformação incessante: a Criação, a Conexão, as Lives e a Pós-pandemia.

CRIAÇÃO:

Por pura curiosidade investigativa, sigo no Instagram, dois compositores. Ambos trabalham com o repertório sertanejo universitário. O primeiro, ensina fórmulas de como compor sucessos, inúmeros sucessos. Sinceramente desconheço algum sucesso seu, mas hoje, seu canal conta em torno de 40 mil seguidores. Em suas fórmulas, faz questão de salientar: “quanto mais parecido você soar com alguém, mais no caminho certo você está!”.

O segundo, não ensina fórmulas, mas suas canções, em sua maioria, contam histórias, cenas, momentos. É um cara de bastidor, bastante reconhecido na cena. Conta em torno de 100 mil seguidores. Define seu processo criativo assim: “compor é manipular os ingredientes da vida”.

CONEXÃO:

O mundo está cada vez mais num misto entre on-line e off-line. Martha Gabriel, a maior autoridade em marketing digital no Brasil, encontrou um meio-termo: “estamos entre bits, bytes e átomos!” É inegável que a experiência sensível tem se alterado. Documentários como “O Dilema das Redes Sociais” e “Privacidade Hackeada” colocam no centro da discussão os estudos de neurociência comportamental focados na inconsciência humana e sua incrível capacidade de “racionalizar” decisões e inclusive escolhas estéticas de roupas, música, artes e entretenimento, sem falar na vida política e suas infatigáveis polarizações.

LIVES:

Trabalhei desde o início da pandemia – por volta de maio – e até agora -, fazendo LIVES. Como produtor cultural criei duas: a LIVE du BALAIO e a LIVE ‘VIOLÃO com VOZ’. Em ambas, convidados músicos, pesquisadores e criadores, além de alun@s e ex-alunos. Também fui convidado para várias, via jornais (Correio do Povo), entre países (Fronteras Culturales) e pelo Brasil. O que virá a partir disso? Ninguém sabe. Qual aprendizado fica? Conto no final deste texto.

PÓS – PANDEMIA:

Tenho lido a opinião de sociólogos, psicólogos, filósofos, jornalistas culturais, antropólogos…enfim, diversificados especialistas que arriscam uma nova direção comportamental da humanidade. As coisas mudaram ou continuarão sendo exatamente igual uma vez estabilizada a pandemia e controlado o vírus covid-19 com uma possível vacina (oxalá!)? Também, ninguém sabe ao certo.

 

O QUE PENSO:

Uma das coisas que mais me alegrou durante esta pandemia foi um arranjo que fiz, no formato que criei e tenho aprimorado – o VIOLÃO com VOZ – da canção FLOR, parceria dos compositores Nico Nicolaiewsky e Silvio Marques. É um clássico do cancioneiro popular! Ouvi-a pela primeira vez em Uruguaiana, no salão de atos do Colégio Santana, num show do Mário Bárbara com o Grupo Saracura. Memória afetiva na veia!

A canção fala de uma FLOR cercada por uma enorme aridez desértica. Só areia no entorno. No entanto, ela ali, florescente e anti-frágil – expressão esta criada pelo filósofo líbano-americano Nassim Taleb para definir um sentimento que vai além da resiliência e empatia, a anti-fragilidade. Um pouco acima da robustez. O que não significa insensibilidade.

Gravei e postei nas minhas redes sociais. Impactou muito, especialmente no meu facebook! Fiquei muito feliz e agradecido, pois consegui dizer com este arranjo tudo que o imagético da canção me transmite.

Por fim, esta canção é o retrato fiel do momento que vivemos. Ou aprendemos a lidar com a complexidade e nos sensibilizamos com a simplicidade – “quer coisa mais simples que uma FLOR, e quanta complexidade há ali!”? Ou seremos engolidos pela “dureza” da vida. E isto independe de ambientes virtuais e físicos, sequer de vírus. O que você acha?

*Artigo originalmente publicado na Revista Acontece Mais – formato virtual. 01/10/2020